Tournay, 31 de março de
2013.
A vocês todos que buscam a paz,
Paz!
No dia onze deste mês de abril, celebramos o quinquagésimo aniversário
da publicação de um dos documentos que mais contribuíram para a paz mundial em
nosso tempo. Trata-se da encíclica “Pacem in Terris” (Paz na Terra), do Papa
João XXIII, que morreria pouco menos de dois meses depois, a 3 de junho
de 1963. Dirigida não somente à Igreja, mas também “a todas as pessoas de boa
vontade” – fato inédito num documento papal até então –, a encíclica se propõe
a refletir sobre “a paz de todos os povos na base da verdade, justiça, caridade
e liberdade ». No seu primeiro parágrafo, deixa claro a sua
proposta : “A paz na terra, anseio profundo de todos os homens de todos os
tempos, não se pode estabelecer nem consolidar senão no pleno respeito da ordem
instituída por Deus” (§ 1). E no seu desenvolvimento, mostrará que
esta ordem querida por Deus (§ 1-7) deve se manifestar no respeito dos direitos
e deveres humanos (§ 8-45), por uma relação democrática entre os cidadãos de
uma mesma nação (§ 46-79), por relações de cooperação e de dialogo entre as
nações (§ 80-128) e pela participaçao de todos em vista de uma convivência unitária
de alcance mundial (§ 129-144).
No contexto da época, no auge da guerra fria e da
ameaça de uma guerra atômica entre Estados Unidos e União Soviética, “Pacem
in Terris” deu uma importante contribuição para a paz, contribuindo
para a superação do impasse criado. O Papa chamou a humanidade à consciência ao
afirmar “que as eventuais controvérsias entre os povos devem ser
dirimidas com negociações e não com armas” (§ 125). João XXIII proclamou
claramente que “não é mais possível pensar que nesta nossa era atômica a guerra
seja um meio apto para ressarcir direitos violados” (§ 126). E não hesitou em
denunciar os perigos da corrida armamentista e da doutrina da dissuasão nuclear:
“o resultado é que os povos vivem em terror permanente, como sob a ameaça de
uma tempestade que pode rebentar a cada momento em avassaladora destruição. Já
que as armas existem e, se parece difícil que haja pessoas capazes de assumir a
responsabilidade das mortes e incomensuráveis destruições que a
guerra provocaria, não é impossível que um fato imprevisível e incontrolável possa
inesperadamente atear esse incêndio” (§ 111).
“Pacem in Terris” deve ser també compreendida como
o testamento espiritual deste papa admirável à Igreja, contribuindo para
colocar a paz no centro da consciência cristã, como responsabilidade de
cada batizado e da Igreja em seu todo (§ 145-171). Rezemos, particularmente,
nesta intenção, para que a paz esteja não somente no centro das preocupações
dos papas e dos documentos da Igreja, mas de cada cristão e de cada homem de
boa vontade. E o façamos com as próprias palavras de João XXIII:
Senhor Jesus Cristo
Ressuscitado, que dissestes aos teus discípulos: "Deixo-vos a paz, a minha
paz vos dou; não vo-la dou como o mundo dá" (Jo 14,27), afasta
dos corações dos homens tudo quanto pode pôr em perigo a paz, transformando a
todos em testemunhas da verdade, da justiça e do amor fraterno. Ilumina com tua
luz a mente dos responsáveis dos povos, para que, junto com o justo bem-estar
dos próprios concidadãos, lhes garantam o belíssimo dom da paz. Inflama,
Cristo, a vontade de todos os seres humanos para abaterem barreiras que
dividem, para corroborarem os vínculos da caridade mútua, para compreenderem os
outros, para perdoarem aos que lhes tiverem feito injúrias. Sob a inspiração da
tua graça, tornem-se todos os povos irmãos e floresça neles e reine para sempre
essa tão suspirada paz (Cf. § 169-170). Amém.
Com amizade, ainda na alegria da Páscoa!
D. Irineu Rezende
Guimarães
monge beneditino da
Abadia Nossa Senhora, Tournay, França